Entre os dias 1 e 7 de Agosto comemora-se anualmente a Semana Mundial do Aleitamento Materno, em mais de 170 países, com o objectivo de encorajar esta prática e fomentar a saúde dos recém-nascidos de todo o mundo.
Antes de ficar grávida já tinha ouvido dezenas de histórias sobre amamentar, poucas delas felizes, muitas, cheias de momentos difíceis e desistências, ainda assim, nunca coloquei a hipótese de não o fazer.
Quando chegou esse momento, não hesitei, mas enquanto acontecia o meu pensamento saltitava entre duas emoções:
- "ok, é isto, que engraçado, oh que querida a alimentar-se, tão pequenina", sentindo muito amor
e
- "esta sou eu! como é que uma pessoa está a alimentar-se de mim? Será que vai correr tudo bem? Como é que vou saber fazer isto quando estiver sozinha? Será que ela vai comer o suficiente? Terei dores?", dizia para mim cheia de dúvidas em crescendo.
Agora que olho para trás, não tenho memória de como o fiz, foi tudo tão estranhamente automático, ainda ferida de uma cesariana com complicações, meio acordada, meio a dormir, ligada a sei lá quantos tubos, aquele serzinho chega e é posto na minha mama, e alimenta-se. Assim, sem mais nem menos, aquilo estava a acontecer, meia hora depois de ter saído da sala de parto.
Semanas mais tarde percebi que não estava preparada, não tinha percebido o verdadeiro peso do intervalo das horas de amamentar, não tinha percebido que tantas dúvidas e medos iriam surgir - será que a criança mamou tudo, cuidei bem do peito de forma a não criar caroços (a trabalheira que dá quando o cansaço já é enorme e nos forçamos a fazer para evitar ter dores), será que fez ferida, quando é que é suposto o bebé comer de novo, etc.
É uma avalanche de assuntos.
Fala-se muito da gravidez, sobretudo do momento do parto, mas curiosamente, este acto de amamentar é tão diminuto nas conversas.
Felizmente decidi que quando teria dúvidas, em vez de ouvir centenas de opiniões, iria ligar para o SOS Amamentação, e que bem que fiz.
Atendem a qualquer momento, sempre com imensa calma, carinho, tempo e atenção e acima de tudo palavras de incentivo para continuar.
Amamentei em exclusivo até aos 6 meses e continuei até aos 8, altura em que deixei de ter naturalmente.
Nunca fui grande fã disto, mas fiz com todo o meu amor e por considerar que esse leite é precioso no desenvolvimento da minha filha.
Sendo orientada, correndo bem, além de bom para a saúde, é verdadeiramente prático, porque no momento em que a criança tem fome, está tudo ali. Não é preciso fazer o leite, nem encontrar a temperatura certa e depois esterilizar tudo, não é preciso andar com imenso peso para todo o lado e, monetariamente, poupasse imenso.
No entanto entendo quem opte por não fazer, entendo perfeitamente o cansaço deste acto e acho super natural que se desista mais cedo do que até se deseja. Ao mesmo tempo que é um laço bonito, que é um acto sem explicação, tão natural, tão sossegado, é extremamente cansativo. Cansativo nas poucas horas em que se dorme, cansativo fisicamente porque o corpo dá alimento a duas pessoas, cansativo psicologicamente quando se têm dúvidas.
Felizmente aquela frase que eu tanto desgostava, aqui aplica-se "só entende quem passa por ele".
E se todas as pessoas no mundo amamentassem, os direitos das mulheres seriam outros.
Ao amamentar, além de sermos julgadas imediatamente pela decisão, somos julgadas também por quanto tempo cada uma decide amamentar, somos julgadas ao amamentar em público. Um acto que deveria ser considerado natural, porque todos biologicamente somos feitos para isto, é julgado, incomoda, e eu senti isso.
Mas mais complicado ainda é quando voltamos a trabalhar e temos de tirar leite com uma máquina, para alimentar horas depois o nosso filho.
Nessa fase, na minha profissão, era sempre uma aventura. A empatia surge quase sempre por quem passou recentemente por isso, creio que os outros esquecem ou acham absurdo que ainda o fizesse!
Se alguns hotéis abriam um dos quartos, dando-me total conforto e privacidade, muitos outros disseram-me que teria de tirar num wc público - um acto que queremos limpo, que precisamos de nos sentar pelos menos durante 30 minutos, num wc público. Nunca consegui, essa ideia bloqueava-me.
Eu tirei leite dentro de autocarros durante o tempo livre no programa dos grupos, com cortinas fechadas e trancada lá dentro; tirei em escritórios de museus; tirei numa sala do posto de turismo de óbidos, eu sei lá, e só posso agradecer a essas pessoas a ajuda, porque a verdade é que não existe um apoio assim nas cidades.
Fica a sugestão para as câmaras deste país, junto aos postos de turismo criem uma sala onde uma mulher possa dar de mamar, se não se sentir bem em público, ou possa tirar leite.
Questiono-me como terá sido com as minhas colegas mulheres?
Por tudo isto, porque é preciso falar mais sobre este acto, para o desmistifar e assim levar mais mulheres a fazê-lo, visto que estarão mais informadas e sentir-se-ão mais sábias nas horas das dúvidas, e porque é preciso mudar a mentalidade dos outros perante uma mulher que amamenta, celebremos.
PS: curiosamente li muito sobre esta celebração em publicações de outros países e muito pouco cá, o que poderá significar?