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A Dica do Luís - Os Açores

Luís Daniel interessou-se por turismo desde a juventude, enquanto estudante a viver na ilha açoriana do Pico, de onde é natural.

Depois de uma incursão pelas Relações Internacionais - Culturais e Políticas, em que de licenciou, regressou às suas duas paixões: os Açores e o Turismo, a que tem estado ligado nos últimos vinte anos, seja como guia-intérprete certificado, como formador ou gestor de cursos de turismo nos Acores.

Pelo caminho, ainda foi encontrando tempo para escrever, coordenar e editar livros sobre o património cultural das ilhas.

Vive em São Miguel, o ponto de partida e chegada do seu mundo.

Hoje, o Luís fala-vos de:

Arquitetura Luso-Brasileira nos Açores

Algumas das principais construções religiosas dos Açores datam dos séculos XVII e XVIII (2), época em que o estilo arquitetónico dominante a nível europeu é o barroco. São caraterísticos deste estilo o marcado movimento das formas, expresso em curvas e contra-curvas, a profusão de elementos decorativos (com preenchimento de todos os espaços disponíveis) e algum exagero nas formas. No país, aumenta o recurso ao azulejo e a produção de talhas douradas, numa altura em que Portugal recebia grandes quantidades de ouro do Brasil.


Na história da arquitetura dos Açores, uma das teorias consiste na divisão da história da arte em “períodos” (3) - tempos estruturais que marcam a história das ilhas, tendo sido definidos em função de acontecimentos que influenciam expressões artísticas desses períodos:


O período que vai de 1642 (aproximadamente coincidente com a Restauração) até 1760 (a expulsão dos Jesuítas dos Açores, um ano depois da sua expulsão do continente português) tem sido designado como “Emigração para o Brasil”. Em termos arquitetónicos, neste período destacavam-se “linhas muito elaboradas, janelas grandes e em grande quantidade, ornamentação abundante sobre a porta e a janela principal (…), poder absoluto da forma e indisciplina nas linhas arquitetónicas principais (4). Este período, além de confirmar a existência ipso facto de emigração dos Açores para aquele país, corresponde igualmente ao tempo aureo da manifestação artística no Brasil, expressa através de um barroco com caraterísticas particulares, num rococó de linhas mais elegantes, que terá sido, na opinião de Germain Bazin “o contributo mais original do Brasil (…) na região de Minas Gerais (…) numa efervescência civilizadora”.


Os edifícios religiosos e civis desta época, nos Açores, apresentam aquilo a que poderíamos chamar “arte barroca luso-brasileira”. É dentro deste contexto que se inserem, nos Açores, muitos dos conventos de franciscanos em várias ilhas, alguns de carmelitas e os três colégios de jesuítas nas ilhas do Faial, Terceira e São Miguel – em alguns casos construídos precisamente para abrigar os religiosos que transitavam entre Portugal e o Brasil e vice-versa.


Um ponto comum a variados edifícios religiosos dos Açores e Brasil, neste período, foi a construção em elevações (em relação ao espaço sobre o qual a construção se ergue),

frequentemente com escadarias, que funcionam como pedestal ao próprio edifício – e que ganha assim uma imponência quase avassaladora.


Terá sido uma introdução portuguesa, é certo, mas tem a sua melhor manifestação em Ouro Preto, no Brasil. Congonhas do Campo, Mariana e, em menor escala, São João del Rey, todas cidades barrocas no estado do Minas Gerais, tem esta interessante caraterística comum. Mas também as famosas igrejas de Nossa Senhora da Glória do Outeiro e de Santo António (num morro, em pleno centro da cidade), no Rio de Janeiro; ou do Bonfim, em Salvador da Bahia, entre tantas outras, têm esta posição elevada. Nos Açores, muitos edifícios religiosos deste período (sobretudo igrejas e conventos) estão efetivamente sobrelevadas em relação ao espaço circundante: na Horta, ilha do Faial (conventos dos franciscanos, carmelitas, colégio dos jesuítas), São Roque e Lajes, ilha do Pico (conventos de franciscanos), Angra do Heroísmo, na ilha Terceira (colégio de jesuítas e convento dos franciscanos), Santa Cruz da Lagoa, em São Miguel (convento de franciscanos). Curiosamente, muitas igrejas construídas sobre edificações anteriores a este período encontram-se perfeitamente integradas no seu espaço, em zonas baixas ou ribeirinhas.


Uma das características da generalidade dos edifícios dos franciscanos, notória no Nordeste brasileiro, em Paraíba e Pernambuco é a fachada que culmina em frontão relativamente simples e desprovido, em contraste com os interiores, com uma explosão de ornamentos e decorações. Exemplo idêntico se encontra em quase todas as igrejas desta ordem, nos Açores.


É nos interiores – ao nível da escultura e pintura – que o chamado “barroco brasileiro” ou, mais corretamente, “barroco mineiro” (uma vez que também podemos falar do “barroco cariosa” e do “barroco baiano”) se manifesta em todo o seu esplendor, tendo o Aleijadinho como figura de proa. Na magnífica Igreja de São Francisco de Assis Ouro Preto) “reinventa o barroco” (5). Os trezentos quilos de ouro usados nos altares e igreja de Nossa Senhora do Carmo, também em Ouro Preto, são exemplos da exuberância e mesmo exagero de detalhes deste período artístico. O “barroco mineiro” deixa ver, nas suas imagens, um expressividade comovente e, por vezes, dramática. Uma marca do Aleijadinho expressa-se na colocação de três cabeças de anjo, angustiados, normalmente em forma triangular, nos – ou em redor dos – altares. E que pode ser vista em construções da Horta, Pico e Ponta Delgada (neste caso, no Colégio dos Jesuítas), substituídos por cabeças de Atlantes, numa adaptação à mitologia local. Um pormenor que, a milhares de quilómetros de distância, e não havendo notícia de que o “mestre” tenha alguma vez passado pelos Açores, mostra que as influências brasileiras aqui foram além do acessório.


Luís Daniel

luismanueldaniel@gmail.com


1 Adaptação e atualização de artigo do autor, originalmente publicado no livro por si coordenado “Faial: Guia do Património Cultural”

2 Data de construção original, ou de reconstrução a partir de templos mais antigos.

3 Aceitando, portanto, a proposta de Francisco Oliveira Martins. Este autor divida a história da arte nos Açores em cinco períodos: Povoamento, Ocupação Filipina, Emigração para o Brasil, Negócio da Laranja, Emigração para os Estados Unidos da América.

4 MARTINS, F. E. O. (1983), Arquitectura nos Açores – Subsídios para o seu Estudo. Horta: Direção Regional de Turismo

5 SARDENBERG, Walterson: Ouro Negro: Esta cidade reluz in Revista "Próxima Viagem" (2002)



Ouro Preto - Brasil

Ouro Preto - Igrejas no alto

Baía da Horta, Faial com as Igrejas e conventos no alto.

Pormenor do retábulo da igreja dos Jesuítas em Ponta Dekgada, ilha de São Miguel

Lajes do Pico, com convento franciscano do fundo, acima da vila

Luís Daniel

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